SENADOR REQUIÃO PROPÕE PROGRAMA DE 5
PONTOS PARA O PRÓXIMO GOVERNO DO BRASIL.
O Senador Roberto Requião,
eleito pelo PMDB do Estado do Paraná, já foi governador três vezes, prefeito de
Curitiba, deputado estadual e duas vezes senador da República. Tem graduação em
jornalismo e ciências jurídicas e, como homem público é considerado por alguns
como polêmico e demagogo enquanto para outros trata-se de político sério,
corajoso e com princípios nacionalistas.
Prestes a comemorar 75 anos de vida, o Senador Requião propõe programa de 5
pontos para o próximo governo implementar e fazer com que o país surja
definitivamente no cenário mundial como uma grande nação.
O programa foi elaborado por
equipe de intelectuais e será apresentado em Convenção do PMDB à realizar-se em
Março de 2016, sendo claro que assim se torna uma opção do seu partido para
candidatar-se à Presidencia da República, inclusive com apóio de forças
políticas de esquerda e nacionalistas, ocupando o lugar do Partido dos
Trabalhadores hoje bastante desfalcado de lideranças e personalidades e muito
desgastado perante a opinião pública.
Os compromissos são: 1, com a
Democracia; 2, com a Soberania; 3 com a Solidariedade; 4, com o desenvolvimento
e 5, com a sustentabilidade.
Importante lembrar que o
Senador é tradicional adversário das Organizações Globo e dos Bancos motivando
assim, dois segmentos importantes que tudo farão para tentar impedir que seus
objetivos sejam atingidos.
Dada a importância do
referido projeto o blog traz para a intelectualidade política e seus ilustres
leitores a proposta assinada pelo Senador Roberto Requião, no mínimo para
profunda reflexão.

“ Olhando numa visão histórica o Brasil
como nação é um êxito: saindo de levas populacionais marginalizadas deslocadas
de suas origens, criamos um povo novo. Indígenas, portugueses e
africanos, acrescidos depois de gente de todo mundo, formaram o povo
brasileiro, hoje, uno e diversificado, dotado de identidade, algo que inexistia
há relativamente poucas gerações. Estruturamos um sistema produtivo, habitamos
um território bem-definido, falamos a mesma língua sem dialetos, fundamos um
Estado Nacional, constituímos memória e sentimentos comuns. Estamos unidos por
uma clara identidade nacional. Ela não tem raízes em ideias de raça ou de
religião, em vocação imperial, em xenofobias e ódios, em qualquer tipo de
arrogância. Tudo nos une na construção exitosa de um mundo novo no Novo Mundo.
Olhamos sempre para o futuro, somos abertos ao que é novo, aceitamos a diferença
e temos na cultura – uma cultura de síntese – a nossa razão de existir. Somos
um grande país e temos o maior povo novo do mundo moderno.
Nossa história também registra, porém, um enorme fracasso: esse povo, a imensa
maioria, não assumiu até hoje o controle de sua Nação. O estatuto colonial
originário transmudou-se em dependência externa e o escravismo prolongado, em
gigantescas desigualdades sociais. Ao longo da história, governado por uma
elite que nunca se identificou com o seu povo, nunca se sentiu nacional, o
Brasil mudou, mas sempre de forma a conservar relações com o passado.
Até recentemente, essa situação podia perpetuar-se, com alto custo humano,
apesar de comprometer significativamente a nossa existência. Agora não pode
mais: o crescimento demográfico, a formação de inúmeras grandes metrópoles, o
acesso à informação e a maior capacitação técnica colocaram o nosso povo diante
de um dilema incontornável. Cada vez mais, ele pode e deve tornar-se o agente
de sua história.
O Brasil, que desde a origem se organizou para servir ao mercado mundial, terá
agora de organizar-se para si mesmo. O Brasil de poucos terá de ser o Brasil de
todos. Se formos incapazes de dar esse salto, nossa existência como Nação
soberana e sociedade organizada estará em perigo. Seria mais realista dizer:
com a crise atual este risco é crescente.
É essa a origem e o sentido da crise brasileira atual.Por isso, ela é dolorida,
profunda, duradoura. Ela não reside na corrupção, fenômeno sempre presente na
natureza humana gananciosa. Reside sim, na falta de diretrizes das lideranças
que galvanize o povo na construção de um Projeto Nacional e que puna aqueles
que o desvirtua.
Nossa história recente é uma impressionante sequência de promessas frustradas.
Muitos brasileiros já se sentem cansados. Para que a desesperança não prospere,
apresento à Nação um documento programático, não isento de autocrítica, que
visa a redefinir a sua própria inserção na vida política brasileira neste
momento crucial.
Temos uma herança a reivindicar. Fomos como próceres e intelectuais do antigo
MDB – depois, PMDB –, que participamos da vida pública. O velho PMDB, principal
condutor da redemocratização do Brasil, não este que aí está. O velho PMDB, que
teve como marco a Assembleia Nacional Constituinte de 1988, presidida por
Ulysses Guimarães. A Constituição então promulgada continha importantes
conquistas, avanços e potencialidades. Na área política, entre outras decisões,
devolveu aos brasileiros o direito de eleger diretamente o seu presidente,
ampliou as possibilidades de participação cidadã, reequilibrou os três poderes
do Estado, criou novas instituições de defesa da sociedade e redesenhou o pacto
federativo, redistribuindo recursos e atribuições entre União, estados e
municípios. Na economia, deu prioridade às empresas brasileiras de capital
nacional e manteve a participação do Estado em setores estratégicos. Na área
social, defendeu os direitos trabalhistas e definiu um sistema integrado de
Seguridade, dotado de orçamento próprio e voltado para garantir amparo aos
segmentos sociais mais fragilizados: saúde pública para os doentes, previdência
para os que ultrapassaram o período de vida laboral, assistência social para
portadores de deficiência e pessoas em situações de risco. Havia um projeto
civilizatório por trás de tudo isso.
Todas as conquistas de constituição de 1988 foram, por inúmeras emendas,
derrogadas.Na década de 1990, assistimos a uma contrarreforma conservadora,
feita em etapas, que se pareceu a um golpe de Estado estendido no tempo. A
Constituição cidadã, escrita à luz do dia, com ampla participação, foi sendo
esquartejada por meio de decisões sucessivas, tomadas sempre de forma discreta,
negociadas não se sabe como, que a sociedade não acompanhou, nem compreendeu,
nem controlou, nem sequer foi chamada a referendar. Na economia, a ideia de um
futuro construído por uma coletividade que interage democraticamente, um futuro
consciente e desejado, tendo como foco um maior bem-estar para todos, foi
substituída pelo futuro opaco que resulta apenas do jogo de mercado, com a
cooperação dando lugar a uma competição feroz que só interessa aos mais fortes;
o conceito de empresa nacional desapareceu da nossa legislação, e o papel do
Estado foi erodido e debilitado. Na área social, com o anunciado “fim da Era
Vargas”, os direitos trabalhistas ficaram sob ameaça e o sistema de Seguridade,
subordinado à lógica do arrocho fiscal, foi retalhado até tornar-se
irreconhecível. Destruiu-se, assim, a Nova República.
Nada disso foi decidido pelos brasileiros de forma livre e consciente.
Programas semelhantes foram implantados em muitos países, sempre com o
patrocínio e a inspiração do sistema financeiro internacional e as instituições
que ele controla, com a conivência de parceiros internos. Seus aspectos
comuns são o desmonte dos mecanismos de solidariedade social, o enfraquecimento
dos Estados nacionais e a subordinação crescente de cada economia aos
movimentos, cada vez mais voláteis, do grande capital.
Os monumentais fracassos dessas políticas são sempre imputados aos elos mais
fracos. Dentro de cada sociedade, o indivíduo é culpado pela sua própria
exclusão, como se não vivesse imerso em relações sociais que são decisivas para
definir as oportunidades que terá. No sistema internacional, os efeitos da
desordem financeira são jogados nas costas dos países periféricos, pois as
crises recorrentes teriam origem em ambientes domésticos insuficientemente
adaptados ao receituário universal da modernidade. O modelo de economia e de
sociedade proposto não pode ser julgado, pois nunca está completamente
implantado. A conclusão se repete monotonamente: dobrar a aposta, seguir em
frente, produzir mais do mesmo, pois sempre falta fazer novas supostas
“reformas”.
Massificado pelos meios de comunicação, esse raciocínio circular provoca um
colapso do pensamento. Com o tempo, a sociedade se torna incapaz de definir uma
agenda própria de desenvolvimento. Deixam de reconhecer seus problemas e suas
potencialidades. Abandona a ideia de ter um projeto comum e civilizatório, um
Projeto Nacional. Acostuma-se a viver em crise crônica. Aceitam a tirania das
questões de curto prazo. Passam a gravitar em torno de temas artificiais e
importados.
Com a porta batendo no batente, fruto da maximização da crise que é política, é
econômica, e será social cabe prosseguir na nossa análise.Nosso crescimento
econômico despencou. Depois de cinquenta anos de crescimento rápido,
completamos duas décadas perdidas seguida por uma terceira contemplativa e
caminhamos, a passos largos, para uma quarta depressiva. Deixamos de ser a
oitava e passamos a ser a décima sexta economia industrial do mundo.
A riqueza concentrou-se nas atividades vinculadas ao mercado financeiro. Estas
se tornaram muito mais atrativas que os investimentos produtivos, que geram
empregos e salários.
A economia desnacionalizou-se ainda mais, com empresas brasileiras sendo
transformadas em massa – até mesmo nos setores mais estratégicos – em filiais
de multinacionais, que reservam para as matrizes as atividades mais nobres. Os
vínculos tênues desse capital estrangeiro com o espaço econômico nacional
atrofiam a capacidade de controlarmos o nosso processo de
desenvolvimento.
O mercado de trabalho desorganizou-se, com cerca de mais de 10% dos brasileiros
adultos sendo remetidos ao desemprego aberto ou ao subemprego crônico, além de
uma grande massa que sempre esteve mantida na informalidade.
A incipiente tentativa de construir um Estado nacional de bem-estar social foi
interrompida. O Estado perdeu capacidade de realizar, induzir e coordenar
investimentos, tornando-se refém do sistema financeiro. Perdeu também controle
territorial, seja no interior do país, como ocorre na extensa periferia da
região amazônica, seja dentro das grandes metrópoles.
Diminuiu a participação de estados e municípios na receita fiscal, e os
serviços públicos se deterioraram.
A fronteira agrícola foi fechada, estabelecendo-se nas regiões novas uma
estrutura de propriedade da terra ainda mais concentrada que aquela que existe
nas regiões de ocupação secular. Em vez de solucionar-se, a questão agrária se
nacionalizou.
A mobilidade social praticamente acabou. O país das oportunidades – pois já
fomos chamados assim – está emparedando, progressivamente, na pobreza, grandes
contingentes populacionais. Pioramos a qualidade da escola pública e
concentramos em grandes cidades multidões sem alternativa de sobrevivência
digna, que só conseguem realizar atividades ocasionais, sazonais, incertas ou
ilegais.
Enfim, se é verdade que alguns setores econômicos se modernizaram,
principalmente aqueles voltados para o mercado externo, também é verdade que
regredimos naquilo que é verdadeiramente importante: estamos mais dependentes e
mais desiguais.
Antes de ser econômica, nossa crise é política, ideológica e cultural. O Brasil
foi levado a considerar-se um país frágil, pedinte, incapaz, necessitado de
buscar salvação fora de si. O futuro da Nação foi hipotecado a agentes que não
tem nenhum compromisso conosco, a não ser o de realizar negócios bem
lucrativos, sempre com o pé na porta, prontos para ir embora. O tempo histórico
da Nação ficou subordinado ao tempo curto do capital financeiro.
O país que em poucas décadas fez a Petrobrás, a Companhia Vale do Rio Doce, a
Embrapa, a Fundação Oswaldo Cruz, a Embraer, a Eletrobrás, uma rede de
excelentes universidades públicas, o IME e centenas de empresas e instituições
desse tipo – que até hoje a sustentam – perdeu a capacidade de fazer, criar e
ousar. Há muitos anos só conjugamos os verbos cortar, vender, desnacionalizar,
fatiar, desmontar, desfazer.
Compreendemos, na sua essência, a gravidade da crise brasileira. Desejamos
propor um novo projeto à Nação.. Trata-se agora de constituir o bloco histórico
capaz de retomar a construção do Brasil, em bases novas e melhores, o bloco
formado prioritariamente pelos grupos sociais que vivem no mundo da produção,
do trabalho e da cultura, de um lado, unidos ao povo mais pobre, de outro.
Valorizar a nossa população e o patrimônio social, cultural e natural na Nação,
eis os fundamentos desse nosso projeto, que se baseia numa arraigada crença na
viabilidade do Brasil. Cinco são os nossos compromisso essenciais.
(a) O compromisso com a democracia. Ele aponta para o aperfeiçoamento do
sistema político brasileiro em bases amplamente participativas, com o resgate
da dignidade da função pública em todos os níveis. Punição aos corruptos.
(b) O compromisso com a soberania. Ele representa a nossa determinação de dar
continuidade ao processo de construção nacional, buscando recuperar para o
Brasil um grau suficiente de autonomia decisória. Valorização do nacional.
(c) O compromisso com a solidariedade. Construir a edificação de uma
nação de cidadãos, eliminando-se as chocantes desigualdades na distribuição da
riqueza, da renda e do acesso à cultura. Educação do povo e Integração
territorial.
(d) O compromisso com o desenvolvimento. Ele expressa a decisão de pôr fim à
tirania do capital financeiro e à nossa condição de economia periférica,
dizendo que mobilizaremos todos os nossos recursos produtivos e não aceitaremos
mais a imposição, interna ou externa, de políticas que frustrem o nosso
potencial. Capitalização produtiva e Industrialização
(e) O compromisso com a sustentabilidade. Ele estabelece uma aliança com as
gerações futuras, pois se refere à necessidade de buscarmos um novo estilo de
desenvolvimento, socialmente justo e ecologicamente viável.Sustentação
ecológica.
A expressão mais imediatado nosso descaminho é a ampla predominância, já faz
muito tempo, muitos anos, de uma “macroeconomia do curto prazo” que se nutre do
próprio fracasso: quanto maior o apelo a ela, maior a crise; quanto maior a
crise, maior o apelo. Ela precisa ser substituída por uma economia do
desenvolvimento, com uma combinação de políticas monetária e fiscal que nos
coloque no rumo do pleno emprego, pois o direito ao trabalho é o suporte da
cidadania. Isso exige desde logo quatro medidas conjugadas: (a) transformação
progressiva e ordenada da dívida pública em investimento produtivo, em obras de
infra=estrutura e em novas fábricas; (b) controle da entrada e saída de
capitais; (c) redução da taxa básica de juros para níveis internacionais; (d)
administração do câmbio em um patamar favorável ao equilíbrio das contas
externas; (e) uma política fiscal e monetária que busque a estabilidade
dos preços.
Nos últimos anos, mais de 40% dos recursos da União têm sido usados com
encargos de dívidas financeiras, restando bem menos de 5% para investimentos. A
desproporção dos gastos com o serviço da dívida, em relação aos demais gastos
do Estado, é chocante. No orçamento da União em vigor, um mês de pagamento de
juros corresponde mais que o dispêndio anual de todo o Sistema Único de Saúde.
Quinze dias correspondem mais que o gasto anual com educação. Dez dias, bem
mais que os recursos alocados no Programa Bolsa Família, que unificou quase
todos os programas sociais anteriores. Cinco dias de pagamento de juros cobre
com sobras o gasto previsto, no ano, para a construção de habitações populares.
Um minuto corresponde mais que à alocação anual de recursos com a defesa dos
direitos humanos.
Tamanha deformação dos gastos do Estado tem um primeiro efeito paradoxal para
quem se preocupa com a saúde das contas brasileiras: provoca um aumento
irracional da dívida externa. Pois as obras em curso, muito insuficientes,
acabam sendo realizadas com financiamento do Banco Mundial ou do BID.
Endividamos-nos em dólar, no exterior, para realizar obras, como em rodovias ou
em saneamento, que não exigem nenhuma importação de bens e serviços. Elas
poderiam ser completamente financiadas em moeda nacional.
Os recursos para financiar a retomada do desenvolvimento, existem, mas estão
presos em uma engrenagem perversa.A permanente busca do superávit primário, tão
a gosto do mercado financeiro, conspira contra a Nação, O primeiro efeito desta
busca é produzir uma transferência de renda dos pobres (os maiores pagadores de
impostos) para os ricos (que detêm os títulos da dívida).
Mas os credores da dívida, principalmente banqueiros, não querem ficar com
dinheiro como contrapartida de suas aplicações. Dinheiro não rende juros.
Tampouco querem investir em atividades produtivas, pois a alternativa mais
confortável, lucrativa e líquida é a própria especulação. Tão logo recebem os
recursos do superávit primário, voltam com eles ao Banco Central e compram mais
títulos, que rendem mais juros. Como esses títulos têm a mesma liquidez da
moeda, sendo negociados diariamente no over, podemos chamá-los de “moeda
financeira”.
Nossa economia funciona com dois tipos de moeda: a moeda comum, à qual nós
todos temos acesso e que se desvaloriza conforme a taxa de inflação; e a moeda
financeira, que rende juros muito acima da inflação. Só os mais ricos e os
bancos têm acesso a esta última. Esta anomalia, até onde sabemos, não existe em
nenhum outro país. É, de longe, o principal mecanismo de concentração da renda
nacional.
Mas há mais: o dinheiro (moeda comum) trocado por títulos (moeda financeira)
também não é investido pelo Estado. O Banco Central o esteriliza, diminuindo a
circulação dos meios de pagamento. Garante ganhos extraordinários aos
aplicadores financeiros, enquanto comprime o crédito, provoca baixo crescimento
e aumenta o desemprego na vida real. Fases de recuperação da atividade são logo
abortadas. A resultante é uma reiterada tendência ao baixo crescimento quando
se observam séries mais longas.
Essa engrenagem precisa mudar. Os R$ trilhões que compõem a atual dívida
pública precisam ser usados criteriosamente para financiar obras de
infraestrutura, segurança e defesa, agricultura e fábricas, os juros desses
títulos devem ser transformados em dispêndio público em educação, saúde,
habitação popular e reforma agrária. Milhões de empregos diretos poderão ser
criados assim. Com o aumento das compras governamentais e da massa salarial,
outros milhões de empregos se seguirão no setor privado. O financiamento disso
não é inflacionário, pois não se trata de emissão primária de moeda. Trata-se
de dinheiro que foi retirado da sociedade por meio de impostos.
A expansão dos serviços públicos não obedece apenas a um imperativo social. Ao
contrário do comércio, dos bancos, das fábricas e da agricultura empresarial,
que incorporaram regras “industriais” de divisão do trabalho, com automação dos
procedimentos, os serviços não vinculados à produção – como educação, saúde, habitação
popular, saneamento e segurança, tipicamente prestados pelo Estado – permanecem
intensivos em trabalho. Como a urbanização aumenta a demanda por esses
serviços, tanto em termos absolutos como relativos, abrem-se por essa via
enormes possibilidades de expansão do emprego. Se em vez de 50 alunos em cada
sala de aula tivermos 25, o ensino será de melhor qualidade e dois professores
trabalharão no lugar de um. Se quisermos prover saúde pública de qualidade,
milhares de profissionais, de todos os níveis, serão requisitados. Espalhar
saneamento é melhorar a qualidade de vida e disseminar trabalho. Tudo isso
fortalece a Federação.
Para os que acham que isso incharia a máquina do Estado, basta lembrar que o
emprego público corresponde a apenas 8,5% do emprego total no Brasil. Nos
Estados Unidos ele corresponde a 16%; na França, a 27%.
A segunda medida de uma nova política macroeconômica é o controle sobre a
movimentação de capitais. Numa economia, como a nossa, que apresenta contas
externas historicamente frágeis, quando os capitais se movimentam sem
regulamentação, para dentro e para fora, alteram-se, antes de tudo, as relações
de poder. Pois a movimentação sem regras de riqueza financeira impede o
controle e até mesmo o cálculo da taxa de câmbio, ameaçando, com esse
descontrole, desorganizar o sistema de preços em que se baseia a economia real.
Como o mercado de câmbio é excepcionalmente volátil, ultrassensível a
movimentos especulativos, o capital financeiro adquire um poder de veto sobre
quaisquer decisões que a sociedade queira tomar. Encurralado, o Estado torna-se
refém desses movimentos. O poder soberano troca de mãos.
Restabelecidos os controles sobre movimentos externos de capital, tal como
existiram no Brasil até 1992, durante mais de sessenta anos – e, portanto,
eliminada a possibilidade de uma corrida do real para o dólar –, o Banco
Central retomará a capacidade de fixar baixas taxas de juros, reduzindo-as sem
dificuldade a um patamar compatível com o equilíbrio das contas públicas e a
retomada do crescimento econômico. Se o mercado financeiro recusar as taxas
menores oferecidas, ameaçando deixar de comprar títulos públicos, o Banco
Central comprará os títulos vencidos ou vincendos, injetando liquidez no
mercado interbancário. Os bancos terão de aceitar as novas taxas oferecidas,
simplesmente porque não terão alternativas melhores para aplicar os recursos em
caixa à sua disposição. O controle da movimentação de capitais não exige
nenhuma alteração de natureza legal, pois já é atribuição do Banco Central.
Alterar omodus operandido Banco Central e do Ministério da Fazenda é essencial
para reorganizar a ação de todo o Estado brasileiro. Pois, como vimos, para
suportar as altas taxas de juros, que realimentam sua própria dívida, o Estado
necessita esterilizar vultosos recursos. O orçamento da União é esquartejado na
boca do caixa para caber no que sobra depois que o Estado paga uma parte dos
juros (outra parte é incorporada ao principal da dívida, que por isso não pára
de crescer).
Por isso, o Brasil funciona sem orçamento. Daí as pedaladas fiscais. Ao
longo do ano, estabelece-se um alto grau de arbítrio na definição de quais
gastos serão de fato efetuados pelo poder público e quais serão
“contingenciados”. Dono da chave do cofre, o Ministério da Fazenda apequena e
subordina os demais ministérios, e o Executivo apequena e subordina o
Legislativo. Tudo depende de decisões casuísticas, tomadas caso a caso, que não
são transparentes nem obedecem a um projeto. Fica aberto o espaço para o
fisiologismo e a corrupção.
A arquitetura institucional da política econômica está virada de ponta-cabeça.
Tendo o Banco Central como seu operador – pois ele age com autonomia, como um
Estado dentro do Estado –, o sistema financeiro subordina a ação de todo o
Estado nacional e do setor produtivo. A democracia se frustra, pois o poder
real fica fora ao alcance do povo. Na nova arquitetura que propomos, o Banco
Central precisará trabalhar de forma intimamente articulada com o Tesouro
Nacional, ambos perseguindo metas combinadas não só para a inflação – como hoje
–, mas também para o emprego, a utilização da capacidade produtiva e o volume
de crédito ofertado à economia real. Essa ação articulada deve assegurar que a
economia seja irrigada com os fluxos monetários e financeiros necessários para
conduzi-la, com relativa estabilidade de preços, a uma posição cada vez mais
próxima do pleno emprego, ou seja, ao nível em que a produção efetivamente
realizada coincida com o uso do potencial produtivo existente. Isso lançará o
país numa dinâmica de crescimento que abrirá espaços para alterar mais
profundamente o modelo em vigor.
Contamos com uma base produtiva moderna, articulada, mas que não está na ponta
tecnológica; e com um mercado de consumo que conserva imensa sede de produtos
tradicionais. São diferenças marcantes em relação à situação dos países mais
ricos – diferença decorrente é claro, do nosso atraso relativo atual. Mas,
paradoxalmente, essa desvantagem contém elementos que, vistos no contexto de
uma estratégia correta, representam oportunidades relativamente fáceis de
desenvolvimento. As mutações na estrutura produtiva podem ser mais velozes e
mais radicais no Brasil, onde a força de trabalho está distribuída por
segmentos que apresentam os mais distintos níveis de produtividade. Deslocando
trabalhadores dos setores mais atrasados para os mais modernos, ou modernizando
esses setores atrasados, há grande elevação da produtividade média, com difusão
desse ganho para a sociedade como um todo.
Para isso, é essencial retomar investimentos em grande escala em
infraestrutura. Ineficiência e crises em energia, transportes e
telecomunicações transformam-se em ineficiência e crises sistêmicas, que
atingem todos os empreendimentos. Esses são setores que exigem projetos grandes
e de longa maturação, sempre relacionados a um planejamento estratégico. O
Brasil é autossuficiente no domínio das técnicas e na capacidade de execução na
maior parte dos setores de infraestrutura, desde que se preserve a engenharia
nacional. Um planejamento integrado deles é essencial para reforçar sinergias,
sem as quais há enorme perda de potencial, e modernizar eixos espaciais de
desenvolvimento, que precisam voltar a ter como principal referência a
integração do nosso território e a dinamização do mercado interno. O papel do
Estado na elaboração dessa visão sistêmica permanece insubstituível.
Só retomaremos um crescimento acelerado se adotarmos uma estratégia que,
contrariamente ao que ocorre hoje, torne mais homogêneos os níveis de
produtividade e de renda existentes em nossa sociedade. São imensos os ganhos
de eficiência disponíveis para ser buscados pela economia brasileira com a
modernização de setores e atividades retardatários, melhor organização social
da produção e da distribuição, maior difusão de técnicas já conhecidas etc.,
com forte impacto sobre o nível de emprego. Quanto à renda, quanto mais
igualitária for a sua distribuição, maior e mais variada será a demanda, e mais
rapidamente o mercado interno alcançará dimensões que permitam ganhos de escala
na produção nacional de bens e serviços, o que aumenta também a nossa
capacidade de competir nos mercados externos.
Numa palavra:precisamos aumentar na maior velocidade possível a produtividade
média do trabalho, reter em nosso espaço econômico a maior parte possível da
riqueza criada e distribuir essa riqueza da forma mais equitativa possível.Isso
significa buscar outro padrão de desenvolvimento, diferente daqueles que
conhecemos no passado. Diferentes formas de propriedade e de organização da
produção devem existir de forma equilibrada, com generoso espaço para os
empreendimentos de porte pequeno e médio, as cooperativas e todas as expressões
da economia solidária.
O Estado precisará definir um conjunto de políticas destinado a baratear
significativamente os custos da alimentação, da habitação e dos transportes. A
mais recente Pesquisa de Orçamento Familiar, realizada pelo IBGE, mostra que
mais de 75% da renda das famílias brasileiras dirigem-se apenas a esses três
itens. Além de ser um indicador de baixa qualidade de vida – pois as pessoas
apenas moram (mal), se deslocam (mal) e comem (mal) –, é uma informação
decisiva para a política econômica, pois explica a atrofia do mercado interno,
que poderia ser o mais importante motor do nosso desenvolvimento. Nos três
setores o Estado tem muito a fazer, de modo a diminuir o comprometimento da
renda familiar com a comida, o aluguel e o transporte, liberando poder de
compra para todos os outros bens e serviços, cuja produção seria assim
dinamizada.
Na nova pauta de investimentos públicos, destacam-se também aqueles ligados à
educação, em todos os níveis, desde a pré-escola até a universidade. O maior
patrimônio de uma Nação é seu povo, e o maior patrimônio de um povo são suas
capacidades culturais. Ainda temos cerca de 10% de analfabetos adultos no
Brasil, e o percentual de analfabetos funcionais – pessoas que sabem assinar o
próprio nome e soletrar palavras, mas que não são capazes de escrever uma carta
ou ler um artigo de jornal – é muito maior. O Brasil será convocado a realizar
um mutirão educacional, e os recursos para isso serão garantidos pelo Estado
como prioridade, para incrementar um processo intensivo, sólido e profundo de
aprendizagem e difusão do saber. A cultura, as humanidades e os avanços
mundiais da ciência e da técnica devem ser difundidos e assimilados,
processados internamente e integrados em um acervo nacional de conhecimentos e
práticas.
Na última década,o Estado arrecadou cada vez mais, gastou cada vez menos com a
sociedade e, mesmo assim, suas contas permanecem desequilibradas. Incapaz de
compensar o enorme déficit financeiro, o corte de gastos aparece sempre como
insuficiente, recolocando a necessidade de novos cortes mais adiante. As
consequências disso sobre a trajetória de uma sociedade periférica e desigual,
como a nossa, não podem ser exageradas. Povos sem Estado são facilmente
expulsos da História. Os países capturados por essa dinâmica, como o Brasil,
terminam por encaixar-se, de forma subordinada, na nova ordem mundial unipolar.
Mas essa ordem não é estável nem permanente. A formação da União Europeia e o
fortalecimento da China contêm as sementes de uma nova ordem multipolar. O
espaço econômico da União Europeia rivaliza em tamanho com o dos Estados
Unidos, e o euro pode vir a questionar a primazia do dólar. As economias do
Leste da Ásia, por sua vez, crescem muito rapidamente e formam uma área cada
vez mais integrada, com o Estado chinês cumprindo um papel regional cada vez
mais relevante. Nos três principais continentes – América do Norte, Europa e
Ásia – surgem megaestados regionais, comandando grandes economias, com grande
base territorial e populacional.
A América do Sul, o Oriente Médio e a África são as grandes regiões do mundo
que ainda não definiram os seus próprios projetos regionais e não constituíram,
nem estão em via de constituir, os seus megaestados. Estão marginalizadas. No
caso da América do Sul, duas grandes possibilidades estão colocadas. A primeira
vem sendo defendida por um número cada vez maior de cidadãos e instituições: a
constituição de um projeto sul-americano que garanta a união dos nossos povos e
a inserção soberana dos nossos países no sistema internacional. A segunda, que
tem na Alca e seus sucedâneos o seu centro de articulação, reforçaria e
tornaria quase irreversíveis os processos de fragilização do continente, com
sua incorporação formal a uma área regional sob controle direto dos Estados
Unidos, a qual poderá vir a ser mais adiante, formalmente, a área do dólar.
Nossa margem de manobra no cenário internacional aumentará significativamente
se a América do Sul assumir um projeto próprio.É um continente com grande
potencial. A complementaridade das economias é enorme. A Venezuela é o segundo
país mais importante do mundo em recursos energéticos, só atrás da Rússia. A
Argentina tem uma agricultura fortíssima. Dos dez países mais bem dotados em
recursos biológicos, seis estão na Amazônia. Temos gás, petróleo, minérios,
capacidade de geração elétrica, água, terras, insolação abundante. Nossos povos
podem construir com facilidade uma identidade comum. Um projeto sul-americano é
necessário e viável. O Brasil tem um papel central nisso e, sem pretensões de
hegemonia, tem grande interesse nessa integração.
Mas é preciso ressaltar que só teremos política externa forte se tivermos
controle sobre nossa própria base produtiva, capacidade de defesa, estoques
estratégicos de alimentos e matérias-primas essenciais, capacidade de produzir
nossas sementes e medicamentos, investimentos pesados e coerentes em
capacitação científica e tecnológica, alto grau de cidadania, e assim por
diante. Projetos multilaterais que permitam um reposicionamento como o BRICS
devem ser incentivados. Esse conjunto de condições é vital para podermos tomar
decisões com uma boa margem de autonomia.
A sociedade brasileira está vivendo uma época critica.Sua sobrevivência depende
da solução que for encontrada. De forma consciente ou não, seremos cada vez
mais chamados a tomar decisões, num ou noutro sentido, que dizem respeito a
questões decisivas: afinal, o Brasil tem sentido? Deseja mesmo se autogovernar?
Pretende fazer do seu povo o construtor da Nação?
Respondemos: Sim. A ampla predominância do capital internacional e de seus
associados internos, no contexto de uma dependência essencialmente financeira,
tem impedido a continuidade dos processos de construção nacional. “Nunca foi
tão grande a distância entre o que somos e o que poderíamos ser”, disse Celso
Furtado, antes de nos deixar. É urgente corrigir nosso rumo. Grandes países
periféricos, como os Estados Unidos do século XIX e a China do século XX, já
enfrentaram esse tipo de desafio, cada um ao seu jeito, e só obtiveram êxito
quando ousaram fazer reformas internas e recusaram o lugar que lhes fora
atribuído pela ordem internacional do seu tempo. Pagaram os custos associados a
tal decisão. Sofreram pressões. Cometeram erros e aprenderam com eles. Ao fim e
ao cabo, conseguiram sair da condição periférica.
As condições essenciais para preparar o salto do Brasil, no século XXI, são de
natureza política (com a definição de um projeto próprio e a vontade de levá-lo
adiante) e cultural (identidade clara, autoestima elevada). Aqui reside
uma fragilidade a ser combatida. Temos de repor a verdade que vem sendo
destruída há mais de vinte anos pela elite venal. Somos um povo belo; mestiço,
sincrético, antropofágico, tropical, feliz, tolerante e orgulhoso de ser
brasileiro. Amamos o Brasil,.
Estamos no limiar de uma fase histórica nova, em que o povo brasileiro assumirá
o comando de sua Nação. Sua elevação plena à condição cidadã é, de longe, o
nosso principal desafio. É preciso transformar a eliminação da pobreza e da
incultura, sob todas as suas formas e manifestações, em um objetivo explícito
ao qual a sociedade subordina os demais. Este objetivo nunca será atingido se
for tratado, como hoje, como o resultado presumido de um modelo econômico
qualquer.
Sabemos ainda ser um país pobre, com brutais desigualdades. Mas não somos
miseráveis e caminhamos para a riqueza.. Ainda temos um parque industrial
articulado e quase completo. Uma população jovem, com presença marcante de
quadros técnicos e pessoas habituadas à produção moderna. Agricultura capaz de
responder a estímulos adequados. Vasto espaço geográfico, recheado de recursos
de todo tipo. Capacidade científica. A História está perguntando se a nossa
geração vencerá a crise que vivemos e as nossas instituições terão a grandeza
de fazer desabrochar a promessa civilizatória contida na sociedade brasileira.
Convocamos todos os brasileiros que desejam responder que o façam repetindo o
nosso sim”.
Papiro Eletrônico acredita que apresentando o texto acima
está
colaborando profundamente para que opções políticas se renovem com o
fim
de trazer para o país, soluções concretas para que atinja seu verdadeiro
destino.
O povo brasileiro de um modo geral ainda acredita na
vocação natural
desse país em ser de verdade uma grande nação.
Roberto J.
Pugliese
Cidadão Cananeense